Cresci sem conhecer esse sentimento que andava na boca das pessoas chamado inveja. Sempre pensei, aliás, que a inveja seria um mito histórico, ou produto da imaginação fértil dos humanos, assunto abordado nos contos de fadas para crianças, que tinham o seu quê de crueldade e fascínio. Também matéria de telenovelas, desculpas para histerias e mentes levadas ao exagero. Por isso, quando me diziam que esta ou aquele tinham inveja de mim ou de outra pessoa, eu incrédula, achava tudo uma telenovela (das portuguesas) e passava à frente. E quando digo cresci assim, quero dizer que cresci muito (bem, o máximo que os meus genes permitiram o que não foi realmente muito, os genes da altura foram mais para a minha irmã), quero dizer que cresci até estar em idade de gente crescida, assim de gente que acaba cursos, trabalha, torna-se independente e até vai viver noutro país. Estão a ver onde é que vai a minha noção de crescida.
Aprendi o que era a inveja há cerca de três anos (vai fazer três anos em Novembro). Aprendi na pele como todas as lições que são aprendidas tarde demais. Aprendi que a inveja mora em quem menos se espera. Em quem menos se espera, no meu caso, que devo ser um bocado tótó e ingénua (factos confirmados pela minha incapacidade de alguma vez ter visto ou acreditado na inveja). Há três anos perdi um amigo, um dos meus melhores amigos de sempre. Soube da noticia a caminho de um jantar. Parei de andar, parei de respirar, parei de falar porque os soluços e a minha falta de ar não me permitiam articular palavras. A muito custo e sem saber bem para onde me virar (as pessoas na rua estavam especadas a olhar para mim), arrastei-me para casa da amiga que dava o jantar. Acredito que o meu estado era deplorável, os olhos inchados, cara vermelha, soluços, dificuldade em respirar, tremia por todo o lado, não estava a pensar sequer, queria apenas chegar a um sitio onde me pudesse sentar e chorar à vontade. A reacção de uma amiga nessa noite foi a revelação da inveja na minha vida. Aprendi naquela noite o que era a inveja. Já não é a primeira vez na minha vida que uma desgraça vem acompanhada de uma lição amarga, isto deve acontecer a muita gente, menos aos abençoados com a estrelinha da sorte (existe sim!). Claro que na altura fiquei apenas confusa, intrigada, magoada, só mais tarde juntei as peças do puzzle, frases ditas anteriormente que nunca me tinham feito sentido, intenções menos claras, piadas estranhas em frente a pessoas, comportamentos obscuros, e fez-se luz (ironicamente claro). Pumba, tinha visto a inveja à minha frente. Não sei bem se é verde. Talvez seja assim de um verde alaranjado. E é uma coisa lixada. Hoje em dia sou mais perspicaz à inveja, mas sendo geneticamente incapaz de a sentir, continuo com grandes dificuldades em a reconhecer. Pior, não sei o que fazer com ela. Continuo amiga da invejosa (credo, até me custa chamá-la assim), desconfio até que sou amiga de mais do que uma invejosa. E não queria, mas é que não sei o que se faz com estas coisas. Não dá para chegar ao pé das pessoas e dizer "Olha, por isto e por isto acho que sentes inveja, é melhor veres um médico", mas seria bom que desse. Seria bom que existissem terapias para a inveja. E calculando eu que a inveja esteja ligada a problemas de auto-estima, e para isso até há terapias, também não é fácil de explicar a alguém todas estas ilações. Até porque gosto das pessoas e tenho tendência a perdoar-lhes coisas das quais me parece que não têm muito controlo ou consciência. Acho até que estas pessoas gostam de mim, o que as deve irritar ainda mais e quiçá aumentar a inveja (é assim que funciona?). Curiosamente, foi uma das minhas amigas com ataques de inveja que me avisou "cuidado ecila que és uma pessoa que atrai invejas" (os entendidos percebem destas coisas). Eu? Mas porquê eu? E deixar-me em paz, boa? Também se lembram de pôr a cabeça a criar desculpas para embirrar com as pessoas que obviamente invejam (agora que já sei o que é, vejo-as a fazerem isto a outras pessoas), sem tomarem consciência (acho). A inveja é realmente muito lixada. Tinha dispensado conhecer tal coisa, obrigadinho. Qual será a base genética da inveja? Porque é que algumas pessoas a sentem e outras não? E o mais importante de tudo, o que se faz com ela?
Mensagem a todos os que sofrem de inveja: Curem-se! Porque não há pachorra.
"Envy is the ulcer of the soul" Socrates (filósofo grego, 469 BC - 399 BC)